Brincando com as palavras
As
palavras são consideradas pelos poetas a matéria essencial de sua arte. Há
poetas que brincam com as palavras de uma maneira única. Lidam com toda uma
ludicidade verbal, sonora, musical e engraçada. Ao juntar as palavras nos dão à
impressão, que as mesmas se movem nas páginas como se fosse uma cantiga, e ao mesmo
tempo brincam com os significados diferentes que uma mesma palavra tem.
Sidônio
Muralho, em TV da bicharada, faz um jogo lúdico e semântico no poema:
Dia de festa:
E tudo que lá
havia,
e tudo o que havia
lá,
que se chamasse
alegria
que se chamasse poesia
só sabia
o sabiá.
Ouçam como ele assobia
Assobia
o sábia.
Nos
versos finais desse poema, o poeta faz um jogo lúdico com as palavras sabia e sabiá, além disso, há uma
leveza de imagens.
Cecília
Meireles, considerada a primeira poetisa brasileira que realmente se dedicou à
poesia infantil tem uma infinidade de poesias, onde explora o jogo de palavras,
as rimas, o ritmo, as imagens e o aspecto sensorial. Eis algumas poesias:
Trocadilho entre a letra erre e o
verbo errar.
“O menino dos ff e rr/ é o Orfeu Orfilo Ferreira: / ai com tantos rr,
não erres!”
As
rimas, as imagens, o ritmo e, sobretudo as emoções (Maria deseja aos outros o
melhor sentimento: a amizade) são também explorados pela poetisa, neste poema:
As meninas
Arabela
abria a janela.
Carolina
erguia a cortina.
E Maria
olhava e sorria:
“Bom dia!”
Arabela
foi sempre a mais
bela.
Carolina,
a mais sábia menina.
E Maria
apenas sorria:
“Bom dia!”
Pensaremos em cada
menina
que vivia naquela
janela;
uma que se chamava
Arabela,
outra que se chamou
Carolina.
Mas a nossa profunda
saudade
é Maria, Maria, Maria,
que dizia com voz de
amizade:
“Bom dia!”
Também
Elias José, em Um pouco de tudo, joga
com diferentes significados da palavra grilo:
Grilo Grilado
O grilo
coitado
anda grilado
e eu sei
o que há.
Salta pra aqui,
salta pra ali.
Cri-cri pra cá,
cri-cri pra lá.
O grilo
coitado
anda grilado
e não quer contar.
No fundo
não ilude,
é só reparar
em sua atitude
pra se desconfiar.
O grilo
coitado
anda grilado
e quer um analista
e quer um doutor.
Seu grilo,
eu sei:
o seu grilo
é um grilo
de amor.
Neste
poema, o autor traz para os dias atuais a problemática vivida pelo personagem
grilo e acrescenta um analista, juntando assim, o bucólico com o urbano, fala
de amor como fator responsável pela “grilação”. Também repete o estribilho,
produzindo assim um poema gostoso de ouvir, pois se aproxima das cantigas de
roda.
Outro
bom exemplo desse jogo poético é o poema de Sérgio Caparelli em “Boi da cara
preta”, no poema “O barbeiro e o babeiro”, o poeta brinca com a letra b, criando situações inesperadas,
situações de bravice, juntando um bebê babão com barbeiro, ao mesmo tempo em
que conta um episódio engraçado desafia à leitura em voz alta.
O barbeiro e o babeiro
O barbeiro comprou um
babeiro
para a baba de seu
filho:
- baba gora, bebê
babão,
de babeiro, babar é
bom.
Depois foi fazer a
barba
do único pai de seu
filho:
Barbeiro a barba e não
babo,
sou barbeiro sem
babeiro.
Mas ao limpar o
babeiro
sua barba se encheu de
baba
e o barbeiro
embraveceu
com babeiro, barba e
baba.
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